Carlos Damião

16 de outubro de 2009

O que as palavras tramam

as palavras tramam
segredos destinos liberdades
tramas políticas em volta
do econômico
tramas
do caos em torno
da liberdade
provisória

as palavras tramam
verdades ainda ocultas
mas a verdade
contém a solidão da mentira
o que se faz ao largo
o que transgride
desabafa intriga seduz
revela
o que as palavras tramam

Poema-risco

a palavra vale
a viagem
mesmo torta
aos trancos
o risco no vazio
o branco brilho
da página
serpentes novos enigmas
certos labirintos
onde qual percurso
mas
a viagem
degrau a degrau
um extremo de emoção
na ausência da solidão


Ilha de Santa Catarina, julho/agosto de 2001

6 de novembro de 2008

A nuvem mais íntima

Quieta no leito
a palavra sorri à
sedução da tormenta.
Penso na tua nuvem
fofa
o branco no azul mais íntimo
- e semeio a paisagem
no jardim do coração.


6/7/2004

20 de agosto de 2008

Orvalho

Encontrar teus olhos
onde a luz seja possível
dissimular o que resta
inexplicado e efêmero:
a visão da pétala
que o olhar desperta no jardim
fingindo a maciez da flor
fragmento da fúria
- e do gozo.

Itajaí, 4-12-2001

A morada esquecida

Corro o risco
Arrisco paisagens de uma
a outra estrada
Vou chovendo o que penso
enquanto nuvem
formando trilhas de sombras
no espelho d'água
a refletir o destino
A música da tormenta
a incendiar a tarde com os sons da distância
- impertinentes -
para a solidão da morada
esquecida
longe
além da paisagem.

Balneário Camboriú, sem data, talvez 2001

5 de setembro de 2007

Jardim dos mitos

Descobrir a palavra
destruir o emblema
a noite mal-pensada
viagem escrita na calma
do nada
Uma flor e o
sopro do vento
- desequilíbrio do pólen
no extremo jardim dos mitos.

Tubarão, 7-10-2003

Como se fosse estrela

A noite vale um
poema vale um
beijo vale a
música à noite
como se fosse
calma
mas a lua vale um
poema vale um
beijo vale a
música à noite
como se fosse
estrela.

Florianópolis, 8-11-2005

16 de julho de 2007

Rio

Um rio só é um rio
quando mergulha e se perde
e é graça
a garça branca
na escuridão do
lodo
surgindo do rio como
o peixe voador
sua fome esguia
atravessando asas
pelas árvores
– e o vento, silencioso,
confidente das águas
e das folhas.



Itajaí, 24-9-2004

14 de julho de 2007

Trapezista

Colho as palavras
como quem,
do trapézio,
colhe o ar.

[De “A Palavra Imediata”, Editora da UFSC, Florianópolis, 1987]

13 de julho de 2007

Haicai

Não nego
a paisagem.
Viajo.

São Paulo, 19/9/1983.